Dos navios negreiros, até a ilha da Jamaica; de uma favela em Kingston para o mundo. Você realmente sabe quem foi Bob Marley?
Conheça a história do rei do reggae e entenda porque “Redemption Song,” é o melhor epitáfio escrito em vida pelo próprio artista condenado a morte.
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Roteiro e locução: Gilson de Lazari
Revisão: Camilla Spinola e Gus Ferroni
Transcrição: Camilla Spinola
Arte da vitrine: Patrick Lima e Caio Camasso>
Edição de áudio: Rogério Silva
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Está de boa aí?
Esse, é o episódio 9 da primeira temporada do Clube e hoje, falarei sobre “Redenption Song,” um Reggae composto em 1979, por “Bob Marley.” E para falar da obra de Bob, é necessário que estejamos de boa. A vibração positiva foi uma das bandeiras defendidas pelo rei do reggae e eu, além de admirar suas lutas e sua obra, tento também, transmitir um pouco desse clima de positividade nos episódios do Clube.
Por isso, se você está chateado, ou até meio puto; estressado com problemas do seu dia a dia, é para você mesmo que será dedicado esse episódio. Garanto que ao fim, estará numa vibe super positiva. Porque a função do reggae é a mesma que a do Clube; te fazer relaxar e viajar nas histórias das músicas que amamos… Essa vida na cidade, as vezes nos deixa esgotados, né? Mas não se preocupe, no final tudo vai ficar bem. Hoje, o Clube quer te trazer esta mensagem. Pode parecer piegas, mas é incrível como vai funcionar.
Mas para te ajudar, o Clube também precisa de uma pequena ajuda… Coisa boba. Que você, que já nos acompanha nas redes sociais, compartilhe esse episódio.
Mas se não é meu amigo ainda nas redes sociais, é fácil resolver; digite na busca: “Clube da Música Autoral.” Estamos no Instagram, no Twitter e no Facebook… vai na fé, porque, nas redes sociais do Clube, só rola conteúdo da hora, sobre as músicas que amamos e falamos aqui no Clube. Mas se você preferir, também posso te adicionar na minha lista de transmissão que róla no WhatsApp e toda vez que sair um episódio novo, você recebe primeiro, diretamente no seu smartphone, para ouvir quando quiser; no seu momento preferido. E por falar em preferências, apresento a minha canção preferida de “Robert Marley;” uma canção de redenção, que hoje vai estrelar no episódio 9, do Clube da Música Autoral. Com vocês… “Redemption Song.”
Como sempre faço, antes de escrever um novo episódio do Clube, andei lendo sobre a história de Bob Marley e descobri, alguns fatos inusitados. Bob, Nasceu no ano que acabou a segunda guerra mundial, 1945. Guerra essa, marcada pelo sadismo aos Judeus. Nazistas, mataram cruelmente milhares de pessoas, simplesmente por julgarem como uma raça inferior.
Bob Marley, era filho de pai branco e mãe negra, e por isso, sofreu muito preconceito, mas combateu a discriminação de raças em suas canções.
Morreu com Câncer generalizado em 1981 e pouco antes de sua morte, se sujeitou a um tratamento desenvolvido por um Médico Nazista, vejam vocês, um médico sádico, que usava cobaias humanas para testes durante a guerra. E foi nessa época, logo após ter descoberto a doença, que Bob compôs sua última canção, Redemption Song.
Toda a história de Bob Marley, do nascimento do Reggae à Redenption song, será narrado hoje.
Segure o choro caro amigo do Clube; muitas emoções ainda nos aguardam no episódio de hoje, mas, antes de falar sobre Bob Marley, precisamos entender um pouco sobre a Jamaica; sobre a religião “Rastafari.” E para falar sobre isso, vamos voltar um pouco essa fita.
Estamos ouvindo, “Louise Benett,” cantando “Day Dah Light.” Uma das músicas mais famosas do estilo “Mento;” precursor do Reggae.
Escravos africanos com habilidades de cantar, tocar e agradar seus mestres, acabavam recompensados por seu talento. Diferente dos E.U.A, onde os tambores foram proibidos, na Jamaica, ritmos como o Mento e o Callypso, baseados nos sons dos tambores africanos, foram incentivados.
A Ilha da Jamaica fica no Caribe; foi colonizada por ingleses e com eles, vieram também uma enorme população africana, de escravos trabalhadores. A escravidão foi abolida na Jamaica em 1834, mas assim como no Brasil, a liberdade plena, ainda demorou mais de um século para ser reconhecida.
Por volta de 1930, negros passaram a ter posições políticas na Jamaica. “Marcus Garvey,” um pastor jamaicano, fundou a “Associação Universal para o Desenvolvimento do Negro.” A organização defendia a criação de um país negro, livre da dominação branca. O pastor, nas suas pregações, costumava repetir uma profecia, de que um Rei negro, descendente da linhagem de Menelik, o filho do rei Salomão e da rainha de Sabá, surgiria para libertar a raça negra do domínio branco.
Essa profecia se concretizou, quando “Ras Tafari Makonnen,” foi coroado Imperador da Etiópia. Para seus seguidores, não apenas um homem, mas um Deus. Tanto que seu nome, inspirou uma religião: “Ras,” significa, “Rei” e “Tafari,” seu segundo nome. Na gíria, “Rastafarai.”
As isenções de Dogmas pragmáticos, tornaram suas crenças ainda mais emblemáticas. No início da década de 30, devido a influência do pastor Marcus Garvey, a religião rasta tinha um forte caráter político, de combate a predominância branca e ao racismo, mas conforme negros ficaram independentes, passaram a viver sob regras naturebas e muita paz e amor. Em 1962, a Jamaica se tornou livre da Inglaterra e independente, puderam finalmente escolher seus governantes.
Uma vida Rastafari, pode ser resumida, em: pura, natural e limpa. E deve seguir uma série de leis de dieta e de higiene, que são passadas por gerações. Um verdadeiro Rasta, não pode ingerir álcool, mas pode usar a Cannabis; na Jamaica, chamada de “ganja.” A justificativa, é libertação mental através de uma erva natural. Seus seguidores, são na maioria, vegetarianos e respeitam a natureza. Seus enormes cabelos dreadlocks, não podem ser cortados ou penteados.
Um detalhe também sobre a religião Rastafári, é que seus seguidores, não podem se submeter a procedimentos cirúrgicos que não sejam naturais. Rastas leem a bíblia; Suas crenças misturam o judaísmo e o cristianismo. Se referem a Deus como “Jah;” uma forma abreviada de “Jeová.”
Apesar da religião Rasta ser de origem Africana, ela se popularizou através da influencia social e política de Marcus Garvey.
Os anos 50, ficou marcado pela chegada dos rádios. O país, adquiriu uma quantidade significante de aparelhos de rádio. Foi quando ocorreu uma importante fusão sonora, misturando o Mento e o Calypso com estilos americanos, como o Rhythm and Blues e o Jazz. Essa junção ganhou notoriedade e foi chamado de “Ska.”
Em Kingston, Capital da Jamaica, empresários estavam ganhando dinheiro organizando audições de discos americanos. Eles haviam montado seus próprios sistemas de som; eram os “Sound Systens.” Uma grande atração para aquela época.
Após a proclamação da independência da Jamaica, em 1962, houve uma super valorização da cultura local e diversos músicos jamaicanos que vinham tocando o ska, passaram a adaptá-lo para um andamento mais lento, enfatizando o tempo fraco e a linha de baixo. Esse ska mais lento, foi chamado de “rocksteady,” que também era o nome de um single de “Alton Ellis.”
Os músicos jamaicanos, começaram a deixar o ritmo ainda mais lento que isso e passaram a acrescentar ainda mais efeitos percussivos; foi então que nasceu o “Reggae.” O termo surgiu em Kingston para definir uma dança, que era mais lenta que o ska. O nome vem de “rege-rege,” uma espécie de gíria, usada para definir roupas sujas, rasgadas, ou mesmo uma confusão; uma discussão do gueto. Em 1964, entrou em cena “Jimmy Cliff.” Ele foi um dos pioneiros da popularização da música jamaicana. Ele lançou uma música chamada: “Wonderfull World, Beautifull People,” chegando ao top 30 das paradas americanas.
Enquanto o reggae era descoberto pelo mundo, na Jamaica, as gravadoras estavam em busca de novos talentos, fechando contratos milionários para distribuições internacionais, mas se esqueciam de monetizar os músicos, que ganhavam muito mau na Jamaica.
Uma banda de rocksteady e ska, chamava atenção em Kingston; eles se chamavam: “Wailing Wailers” e na sua formação original, contavam com Peter Tosh, Bunny Wailer, Beverley Kelso, Cherry Smith, Junior Braithwaite e Bob Marley. Em 1965, lançaram seu disco de estreia. Nele, olha o que eu encontrei… a primeira versão de “One Love,” gravada no ritmo ska. Um jovem pardo se destacava como líder do grupo, seu nome era “Robert Nesta Marley.” filho de um militar inglês e uma adolescente jamaicana. Marley, nasceu em 1945, quando sua mãe tinha apenas 17 anos e seu pai, vejam, 60 anos.
O pequeno Nesta, cresceu na cidade de Saint Ann, no interior da Jamaica. E sem a presença do pai, sua mãe decidiu tentar a vida na cidade e mudou-se com Marley para “Trenchtown;” a maior e mais miserável favela de Kingston. Lá, Marley passou, a ser provocado e rejeitado pelos negros locais, por ser mulato e ter baixa estatura. Como refúgio, passou a tocar violão, o que acabou socializando o pequeno garoto, que crescia em conflito, sem saber se era branco ou negro. Os donos de Sound Systens, ditavam os lançamentos da música americana que chegavam em Kingston e logo, passaram também a investir em novos talentos, gravando em estúdios improvisados..
Com 14 anos, Marley, abandonou a escola para se dedicar exclusivamente à música, mas, sua mãe não gostou nada da ideia e temendo que ele se tornasse um “rude boy,” nome dado para os garotos rebeldes de Kingston, o obrigou a seguir carreira de soldador e passou a trabalhar como aprendiz em uma oficina.
Marley conheceu “Bunny Wailer” nessa época e eles se tornaram os melhores amigos. Nas horas vagas, se encontravam para cantar. Conforme iam melhorando, a dupla, passou a fazer aulas, com “Joe Higg,” um cantor, que já se destacava no estilo SKA. Foi em uma dessas aulas, que Marley, encontrou um garoto com as mesmas ambições que ele; seu nome era “Peter Tosh” e os três, ficaram amigos.
Em 1962, Bob fez uma audição e como parte do teste, gravou uma música de sua autoria, chamada “Judge Not.” Ela não chegou a ser lançada, mas mostra o potencial de composição de Marley, que na época tinha apenas 17 anos. Ouça essa rara gravação.
Os ambiciosos empresários da indústria fonográfica jamaicana, incentivaram para que Marley montasse uma banda. Então, os três amigos fundaram o “Wailing Wailers.”
“wail,” significa, “lamentar” e eles diziam que as letras, simbolizavam o lamento do gueto. Um percussionista rastafári, chamado “Alvin Patterson,” apresentou os garotos para o produtor “Coxsone Dodd” e no verão de 1963, resolveu gravar o som desse grupo.
Marley escrevia letras falando do cotidiano dos guetos, e isso, agradou o público. Acabaram emplacando outros sucessos, mas a banda começou a se desfazer, mediante as dificuldades financeiras. Os donos das gravadoras eram meio mafiosos, sabe? Eles queriam gravar os jovens talentos, mas não gostavam de remunerá-los.
Nesse meio tempo, a Mãe de Marley casou-se novamente e foi embora para os E.U.A. Após alguns meses, mandou uma passagem para Bob e a intenção dela, era que o filho tivesse uma vida nova na América. Mas Marley, havia acabado de conhecer “Rita,” com quem se casou, antes de embarcar para os E.U.A. Bob, ficou apenas 1 ano na américa, tempo suficiente para ganhar dinheiro, para investir em sua carreira musical na Jamaica.
No período em que esteve fora, o imperador da Etiópia, “Haille Selassie,” o representante maior da cultura Ras Tafari, havia visitado a Jamaica e fortalecido o movimento religioso.
Quando Bob voltou dos E.U.A, já com novas ideias, passou a se envolver ainda mais com o movimento Rastafari.
Em 1968, Bob foi preso por porte de maconha, que por incrível que pareça, é uma droga ilegal na Jamaica. Apesar de ficar apenas um mês no xilindró, esse tempo que conviveu com outros presos, foi imprescindível para desenvolver o senso social aguçado de Bob Marley.
Completamente convertido ao Rastafari, Marley, além de excelente críticas sociais, passou a compor também, temas espirituais e essa junção acabaria se tornando sua marca registrada.
Bob convidou Peter Tosh e Bunny Wailer para reorganizar o grupo, que agora se chamava apenas “The Wailers.”
Rita, esposa de Marley, havia se lançado como cantora e na sua estreia, gravou uma versão de “Pied Piper,” que fez muito sucesso
Devido ao grande envolvimento do grupo The Wailers com a religião Rastafari, as gravadoras jamaicanas acabaram colocando eles na geladeira. Sem perder tempo, os Wailers resolveram montar sua própria gravadora, mas faliram antes mesmo de conseguir lançar o primeiro disco.
Um Cantor americano chamado “Johnny Nash,” que estava investindo sua carreira em música jamaicana, ouviu uma demo dos Wailers e resolveu gravar uma de suas canções, chamada: “Stir it Up.” Stir it Up foi um baita sucesso. Então, o DJ, produtor musical e mago de estúdio, “Lee Scratch Perry, entrou em cena.
Lee renovou o The Wailers convidando o baixista Aston e seu irmão Carlton Barret, para tocar bateria. Era o toque que faltava para acontecer o reggae, como o conhecemos hoje. Ouça a versão original de “Soul Rebels,” como foi registrada por Lee Perry em 1969. Com essa formação eletrizante, os Wailers começaram a definir o rumo do reggae jamaicano. Então, foram convidados para tocar na Europa em uma turnê, ao lado do cantor Johnny Nash, mas deu tudo errado. Johnny Nash, estava trabalhando na trilha de um filme que acabou indo por água abaixo. Então, Bob e os Wailers, ficaram em maus lençóis na Europa, mas Marley teve a ideia de procurar o produtor musical, “Cris Blackwell,” filho de ingleses,, que havia nascido na Jamaica.
Cris havia acabado de montar uma gravadora independente, chamada “Island Records” e sua primeira aposta, era a banda, até então desconhecida, “Jethro Tull.”
Cris Blackwell já conhecia a reputação de Marley e dos Wailers na Jamaica, então os contratou, dando um cheque de 4 mil libras para que a banda voltasse para a ilha e produzissem o primeiro disco dos Wailers, o icônico: “Catch a Fire.”
Quando foi lançado, na capa de Catch a Fire, havia uma foto de Bob Marley com os cabelos ainda em fase de crescimento, fumando um belo cigarro de maconha. Era essa a imagem questionável que chegava na Europa e nos Estados Unidos; o primeiro disco dos Wailers.
Antes de lançar Catch a Fire, a gravadora não botou muita fé no reggae dos jamaicanos e incluiu músicos ingleses nos arranjos, que tocaram solos de guitarra e teclados. A estratégia, era que soassem mais próximo de uma banda de rock, mas, não foi o que aconteceu e o reggae predominou.
Empolgados com a aceitação do público, a gravadora organizou duas turnês de divulgação para o Wailers; uma na Europa e outra nos E.U.A, onde abriam alguns shows para a maior banda de Black Music da época, “Sly & The Family Stones.”
As letras de paz e o engajamento social, casaram perfeitamente com o movimento jovem, que estava acontecendo nos E.U.A, devido à contraditória guerra do Vietnã.
Felizes com as vendas de Catch a Fire, a Island records, resolveu dar um presente para Bob e compraram para ele uma mansão no centro de Kingston, na área nobre, onde viviam, políticos e pessoas influentes. Bob transformou o local em uma sede rastafári. Lá, passaram a morar centenas de pessoas, e moradores dos guetos, chegavam a fazer filas para pegar o dinheiro que Bob Marley estava ganhando com a venda de seus discos e fazia questão de distribuir sem qualquer cerimônia.
Bob estava trilhando um caminho perigoso, em que chamava atenção de muita gente, tanto para o lado bom quanto para o ruím. E aproveitando o bom momento, a gravadora lança em 1973, o segundo disco: “Burnin.” Mas desta vez, assinado como “Bob Marley e os Wailers.” Ainda Mais politizado que o disco anterior, Burnin chamou a atenção de músicos célebres, como “Paul Maccartney” e “Mick Jagger,” que passaram a comentar em suas entrevistas sobre a arte de Bob Marley. Inclusive, um outro roqueiro inglês que estava na maior bad nessa época, conseguiu se reerguer, com uma regravação de “I Shot the Sheriff,” que eu falo bastante, no episódio “Tears in Heaven,” que é o piloto do Clube da Música Autoral… sabe?
A essa altura, a Reputação de Bob Marley na Jamaica já era algo místico. E em 1974, lançaram o terceiro disco: “Natty Dread.”
Na capa, uma foto de Bob com os cabelos Dreadloks, começando a chamar a atenção. “No Woman no Cry,” colocou Marley no primeiro lugar das paradas inglesas.
Visualmente ofuscados pelo sucesso de Bob Marley, Peter Tosh e Buny Wailer, se desligaram da banda para seguir carreiras solo. Eles foram substituído por um trio vocal feminino, o “I Threee,” onde Rita, esposa de Marley faz parte.
Em 1975, o imperador etíope e mestre do movimento Rastafari, Haille Selassie, faleceu. Na Jamaica, a cultura Rastafari já tinha Bob como seu principal expoente, que no mesmo ano, lançou mais um disco de sucesso mundial: “Rastamam Vibration.”
Em 1976, foi ano de eleições parlamentares na Jamaica. A ilha, vivia um dos períodos mais sangrentos da sua história. Era praticamente uma guerra civil entre jovens militantes de dois partidos avessos ideologicamente. De um lado, o “PNP,” chamados pejorativamente de “comunistas” e do outro, o “JLP,” chamados de “fascistas.”
Bob Marley não queria se envolver com política, mas acabou sendo ludibriado a fazer um show gratuito pela paz e pela união da juventude jamaicana, organizado as escondidas pelo então, primeiro-ministro do partido PNP. Para piorar, o governo mudou a data das eleições para apenas alguns dias após o show de Bob Marley. Isso enfureceu os opositores, pois o poder de influência de Marley na Jamaica era enorme.
Dois dias antes do show, pistoleiros invadiram a mansão comunitária de Bob Marley e dispararam tiros em todas as direções. Felizmente ninguém foi morto, mas “Don Taylor,” empresário de Marley, ficou na linha de tiros e acabou paraplégico. Rita Marley levou um tiro de raspão na cabeça e Bob, um tiro que raspou em seu peito e penetrou profundamente em seu braço esquerdo, onde a bala ficou alojada. Mesmo assim, Bob resolveu subir ao palco e mostrou os seus ferimentos ao público, que foi a loucura. Foi Nesta ocasião que ele disse uma de suas mais conhecidas frases: “As pessoas que querem destruir o mundo não tiram um dia de folga. Como eu posso tirar folga, se estou fazendo o bem?”
O PNP, partido que Marley acabou apoiando mesmo sem querer, ganhou as eleições e temendo por sua vida, Marley se mudou para a Inglaterra e lá, gravou o que muitos consideram o seu melhor disco: “Exodus.”
Os Jamaicanos clamavam pela volta de Bob Marley, que resolveu voltar para a Jamaica em 1978 e concedeu um concerto gratuito em Kingston para comemorar o seu retorno.
No dia 22 de abril de 1978, Bob Marley se apresentou no Estádio Nacional de Kingston, no famoso “One Love Peace Concert.” Neste show, Marley chamou ao palco, o então, primeiro-ministro jamaicano, “Michael Manley,” líder do partido PNP e “Edward Seaga,” líder do partido da oposição, para que dessem as mãos e fizessem um juramento de paz. A multidão que assistia ao concerto foi à loucura. Dizem que Bob fez isso de improviso.
Bob estava em casa feliz e com as vibrações em dia. Para comemorar, em 1978, fez um disco dedicado à maconha. Ele se chama: “Kaia.”
Apesar de suas letras sobre a liberdade e combate ao racismo, Negros não estavam comparecendo em seus shows. Os ingressos de suas turnês pelos E.U.A, se esgotavam e na plateia, uma maioria branca predominava.
Incomodado, Marley resolveu excursionar na África. Visitou, Quênia e Etiópia; países sagrados devido a referência Rastafari. E foi lá, ao conhecer a África e todos os problemas sociais do continente, que Bob concedeu seu disco de cunho politico e social mais afiado: “Survival.”
Nesse álbum, Bob lançou uma música em homenagem ao grupo de rebeldes negros da Rodésia, que lutavam pela independência e estavam prestes a conquistá-la. A música de Bob, influenciou e ajudou na criação do estado independente de Zimbabwe.
Survival, chegou a ser censurado na África do Sul pelo regime do Apartheid e Bob Marley foi convidado para tocar na festa de independência do Zimbabwe. Um show histórico.
Durante uma série de shows em Nova Yorke, Bob acordou cedo como sempre e saiu para correr. Inesperadamente, ele sentiu fortes dores no pescoço e com espasmos por todo o corpo, Bob desmaiou.
Sua religião Rastafari, exigia que ele mantivesse seu corpo em ordem. Bob era um atleta; além de correr, seu esporte preferido era o Futebol. Mas por uma infelicidade, o próprio futebol seria o responsável pelo agravamento de sua doença.
Alguns anos, antes desse súbito desmaio em Nova Yorke, Bob machucou o dedão numa partida de futebol, mas estranhamente, o ferimento não cicatrizou. Logo, os médicos descobriram que tratava-se de um “melanoma,” uma espécie de câncer de pele, que não atinge negros, mas infelizmente, Bob era filho de um homem branco.
Médicos então, indicaram que Bob amputasse o dedão do pé, mas a religião Rastafari não permite procedimentos que não sejam naturais. Além disso, Bob temia perder a mobilidade no palco e não poder mais praticar esportes; sua segunda paixão, após a música.
Então lhe foi apresentada uma solução alternativa; uma raspagem da pele doente e um enxerto. Se resolvesse, Bob não precisaria amputar o dedo. Deu certo.
Mas o que aconteceu naquela manhã em Nova Yorke, foi um efeito colateral do enxerto de pele. O câncer se espalhou pelo corpo de Bob e exames mostraram que seus pulmões estavam comprometidos pela doença. Para piorar, um crescente tumor, foi identificado em seu cérebro.
Bob não esmoreceu; continuou com sua agenda e shows. E em 1980, entrou em estúdio, onde gravou seu último disco, “Uprising.”
Uprising, cujo significado é “revolta,” é o álbum de maior cunho religioso de Bob Marley. Inicialmente, era um disco mais denso e sério, mas através de um pedido do produtor “Cris Blackwell,” Bob compôs “You Could Be Love,” que foi o grande sucesso do disco.
A maioria das letras desse álbum fazem referência a religião Rastafari. Claramente abalado por seu diagnóstico médico, uma das canções mais emblemáticas do disco, se chama: “Redemption Song.” Ela é considerada o “canto do Cisne” de Bob Marley.
Em Redemptions Song, Bob Marley é acompanhado apenas por um violão que ele mesmo executa. Eu não costumo fazer traduções pontuais no Clube, mas em Redemption Song, vou abrir uma exceção.
Velhos piratas, eles me roubaram,
Me venderam para os navios mercantes,
Minutos depois deles Me tirarem do porão sem fundo,
Mas minha mão foi feita forte,
Pela mão do Todo-Poderoso,
Por isso seguimos nessa geração Triunfantemente.
Você não vai ajudar a cantar Essas canções de liberdade?
Pois é tudo que já tive,
Canções de redenção,
Canções de redenção.
Emancipem-se da escravidão mental,
Ninguém além de nós mesmos pode libertar nossa mente,
Não tenha medo da energia atômica,
Porque nenhum deles pode parar o tempo,
Por quanto tempo vão matar nossos profetas enquanto ficamos parados olhando?
É, alguns dizem que é só uma parte disso,
Temos que completar o livro,
Você não vai ajudar a cantar Essas canções de liberdade?
Pois é tudo que já tive,
Canções de redenção,
Canções de redenção.
Tudo que já tive,
Canções de redenção,
Essas canções de liberdade,
Canções de liberdade.
Já no título, Redemption Song, que ao pé da letra significa, “canção de redenção,” é importante destacar a real intenção de Bob sobre a palavra “redenção;” algumas pessoas podem pensar em redenção como uma desistência; render-se entregar-se ao inimigo.
Mas a Redenção de Bob é bíblica. Ele refere-se a aceitar seu destino. E um dos privilégios da redenção, é receber a vida eterna.
Bob está falando da redenção da alma e já ciente de sua insignificância, nos diz que essa é apenas mais uma Canção de Redenção.
Simples. Tão simples, que muitos nem a consideram uma canção finalizada. A ideia de executar Redemption Song, no violão e voz foi do próprio Bob, que produziu esse disco em parceria com Cris Blackwell, que o apoiou na decisão.
Na interpretação, além de não nos deixar esquecer o sofrimento dos africanos que foram escravizados, Bob também faz citações políticas, quando diz que precisamos nos livrar da escravidão mental, ou seja, é triste lembrar que poucos brancos eram capazes de controlar centenas de negros, pois a escravidão atingiu níveis psicológicos; a tal “escravidão da mente.” E muitos desses resquícios, até hoje não foram reparados.
Bob tinha plena consciência disso e fez questão de usar o verso de Marcus Garvey, um defensor do nacionalismo negro e responsável pela propagação da religião rastafári na Jamaica. Ele dizia: “Vamos nos emancipar da escravidão mental, porque enquanto outros podem libertar o corpo, ninguém além de nós mesmos, podem libertar a mente.”
Esta letra foi escrita logo após Bob Marley ser diagnosticado com câncer. Ele contemplou sua mortalidade e percebeu que a única maneira de causar impacto, era através de suas canções, que transcenderiam sua morte.
Olha… em 2017, eu também passei por um tratamento de câncer e desde então, fiquei mais sensível e compreensível, com quem precisa passar por isso. Assim como Bob e muitos outros músicos, também fiz meu disco de lamentos, que em breve será lançado com o nome de ”Delírios musicais.” Ele ainda está em fase de produção.
No meu caso, eu fiz uma cirurgia, retirei o câncer, fiz o tratamento e momentaneamente, estou livre do meu tumor, mas Bob Marleyy não teve a mesma sorte. O Tumor dele já havia se espalhado por órgãos vitais, como o Pulmão e o Cérebro.
Bob chegou ao ponto de negar mandamentos rastafári e aceitar ser tratado por um médico ex-Nazista, chamado “Joseph Issels,” na época, conhecido por seus tratamentos alternativos, dolorosos e controversos no combate ao câncer.
Bob fez quimioterapia, mas antes cortou seus lindos dreadlooks para evitar que caíssem. Ele viveu os últimos meses de vida, no frio de Munique na Alemanha, mas seu tratamento não obteve êxito. Pesando apenas 35 quilos, Marley voltou para morrer na Jamaica, mas por complicações, acabou pousando em Miami, onde seus 11 filhos foram convocados para a última despedida em vida.
Bob Marley faleceu no dia 11 de maio de 1981. Ele tinha apenas 36 anos.
Estamos ouvindo, o que na minha opinião, pode ser a melhor versão de Redemption Song. Aqui, interpretada pela inusitada dupla: “Johnny Cash” e “Joe Strummer,” o lendário vocalista, do “The Clash.” Curiosamente, os dois faleceram em 2003, ano em que lançaram essa versão.
Na minha opinião, Bob Marley foi perfeito em Redemption Song. Nenhum outro grande artista escreveu e realizou seu próprio epitáfio com um timing assim, tão perfeito.
Redemption Song, foi a última música que Marley escreveu; a última que entrou em estúdio para gravar e foi lançada no seu último disco antes de morrer.
Foi também a última música que ele tocou ao vivo, sentado em um banquinho, sozinho no palco de um teatro em Pittsburgh, ele fechou aquele show cantando através de um véu de tristeza insuportável, como se desse conta de sua despedida diante de seu público e seu Deus. Bob perguntava: “E você? Não vai me ajudar a cantar essa canção de liberdade?”
Sabe, caro ouvinte do Clube, eu tenho um amigo de infância, que está preso; condenado por crimes que não me cabe aqui comentar. Esse amigo, é também um cantor que tocou comigo no início da minha carreira musical. Em comum, gostávamos muito de Bob Marley e nas rodas de violão, preferíamos cantar os clássicos, mas esse amigo tinha uma ligação profunda com Redemption Song.
Eu não entendia, Mas lembro que ao cantá-la, ele se retraía; parecia abraçar o violão. Fechava os olhos e a cantava em voz baixa, quase sussurrando e toda vez ele sempre dizia: “essa é a melhor canção do Bob.”
Hoje eu consigo concordar com ele. Tanto, que quero dedicar esse episódio para esse meu amigo, que vai poder ouvi-lo na hora certa, assim como poderei ouvi-lo novamente, cantando sua canção de liberdade.
Em 2001, os Wailers entraram em estúdio para gravar essa nova versão de Redemption Song. Ela foi lançada na coletânea: “The Very Best Bob Marley.”
E é assim, esperançoso, um tanto quanto emocionado, mas, confiante no poder da música, que eu me despeço do episódio 9 do Clube da Música Autoral.
E aí? Curtiu?
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Quer ouvir mais? Todos os episódios do Clube, você encontra no meu site, clubedamusicaautoral.com.br, mas se quiser receber diretamente em seu smartphone, é só acessar o link que está na descrição desse episódio e confirmar a mensagem. Eu vou te adicionar a lista de transmissão do WhatsApp e você, vai receber todos os novos episódios em primeira mão para ouvir quando quiser.
O Clube da Música Autoral tem uma missão, que é espalhar música boa e histórias legais pela rede, mas para que essa missão continue, eu preciso que você faça a diferença e seja sócio do Clube.
Todo os associados poderão votar e escolher os temas dos próximos episódios. Já imaginou a sua canção preferida sendo narrada aqui no Clube?
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Se por acaso você ficou com gostinho de quero mais, aviso, que acabei de fazer uma playlist no Spotify, com todas as músicas usadas nesse episódio, tá? Ouça Bob Marley, sem moderação. Faz bem a alma e não tem contra indicação. No máximo, você vai querer sair por aí distribuindo abraços e sorrisos… né?
Com a esperança de ter melhorado o seu dia, eu fico por aqui… Meu nome é Gilson de Lazari e foi um prazer falar de música com você.
Até a próxima!