“Chico Buarque de Holanda,” afeto ou desafeto?
Aqui no Clube, o que importa é a música, mas também gostamos de boas histórias e “Jorge Maravilha” é dose dupla!
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Roteiro e locução: Gilson de Lazari
Revisão: Camilla Spinola e Gus Ferroni
Transcrição: Camilla Spinola
Arte da vitrine: Patrick Lima e Caio Camasso>
Edição de áudio: Rogério Silva
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Contar a história do Julinho da Adelaide e não falar de Chico, seria cômico. Para quem não sabe, eles são a mesma pessoa. Chico, usou esse pseudônimo, para tapear os militares, que vinham censurando todas as canções que levavam a assinatura de Chico Buarque e uma das mais emblemáticas, é Jorge Maravilha.
E valeria a pena, contar a história de Chico, sem se lambuzar nas suas polêmicas dos tempos de Ditadura Militar? mmmm… não, Pois, foram as polêmicas, o espírito desbravador e o romantismo velado, que definiram a personalidade de Chico Buarque.
Eu consigo separar poesia e política, assim… tranquilão, sabe? Mas Muitos, não conseguem. Alguns, inclusive negam, que existiu Ditadura no Brasil. É um assunto polêmico, eu sei. E muitos, também não gostam da voz de Chico. Ela, é meio anasalada e peculiar, mas, vale lembrar que o cara gravou, 37 discos de estúdios e compôs canções clássicas, que foram eternizadas por outros intérpretes. Chico, já faturou três prêmios Jabutis como escritor e como dramaturgo; produziu peças aclamadas, como Calabar e Roda Viva. E também, foi Chico que fez a minha trilha sonora brasileira preferida, Os Saltimbancos. Quem se lembra, hein?
Enfim, Chico também, participou do cinema novo; já escreveu roteiros, dirigiu, atuou, produziu. Olha, seria mais fácil, falar sobre o que ele não fez.
Caro ouvinte, estou inspirado, hoje, recebi algumas mensagens legais pelas redes sociais e quando isso acontece, os roteiros ficam ainda melhores. Se você se sentir à vontade, também pode interagir comigo nas redes sociais. No final dessa temporada, eu farei um episódio extra, junto com o Cocão, para ler os melhores comentários. Siga o Clube no Facebook, Twitter, Instagram e no YouTube. É só procurar por “Clube da Música Autoral,” que só de acompanhar, você já começa a fazer parte desse Clube.
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Ok Ok, sem repressão e sem mais delongas, vamos ao que interessa, pois, como já dizia Jorge Maravilha: “Prenhe-se de razão e diga que mais vale um episódio do Chico no ar, do que voando dois do Lobão…”
O Brasil, viveu um longo período sob ditadura, mais precisamente, de 1964 até 1984. Foram longos 20 anos que deixaram sequelas em uns e saudades em outros. Ser artista no período da ditadura, não era nada fácil.
É difícil explicar, o motivo do golpe militar no Brasil, sem ser vago. Mas, posso citar alguns fatores, que influenciaram essa intervenção. A má situação econômica do país, foi um dos fatores. Diversos governantes, se sucederam no poder (Dutra, Getúlio, Juscelino), sem que o problema econômico, fosse resolvido. E pior, eles apenas se agravaram com o tempo.
Os reflexos da guerra fria, entre União Soviética e E.U.A, também influenciaram, pois os russos, estavam treinando rebeldes sul-americanos, com táticas avançadas de guerra, além de estarem enviando armamentos pesados para cá. Em contrapartida, os E.U.A, tentavam fortalecer o capitalismo e para isso, despejaram dinheiro no Brasil, que era usado, no combate contra o comunismo. Com tranquilidade, posso dizer, que foi sim, uma típica treta, esquerda vs direita.
Segundo os militares, a ação de 64, foi necessária, pois, a nação estava em perigo. Pela ótica dos Milicos, corríamos um sério risco, de nos transformarmos em um país refém da ditadura comunista. E pra que isso não acontecesse, correram na frente e implantaram primeiro, uma ditadura militar… olha só. Mas, como que aconteceu uma barbaridade dessas?
Em 1961, Jânio, o Quadros, renunciou e em seu lugar, assumiu a presidência, seu vice,, João Gullar, o Jango. Taxado pejorativamente, de comunista. O partido de Gullar, defendia um inofensivo plano de reforma agrária, que jamais passaria pelo congresso conservador brasileiro. Mas, quando Jango, assumiu a presidência, aí, a brincadeira ficou séria. A imprensa, começou a destacar esses planos, dizendo como maléficos. Logo, empresários e agricultores, principalmente da área pecuária do Brasil, uniram-se aos militares e financiaram uma comissão civil pró golpe.
Sob o comando do General, Olympio Mourão, tropas marcharam de Juiz de Fora para o Rio de Janeiro, no dia 31 de março de 1964 e assumiram o Governo. Jânio, estava em Porto Alegre, mas, deram um migué que ele havia deixado o país, sendo assim, declararam que a cadeira da presidência, estava vaga e sentaram nela. Como ninguém tentou tirá-los de lá, eles ficaram… por 20 anos.
Mas Gilson, esse podcast, não era sobre música? Que papo chato é esse aí, de política, golpe, etc.?
Calma caro ouvinte, a história de Chico Buarque e da Ditadura militar, andam juntas. É impossível falar de um, sem citar o outro.
Em um de seus depoimentos, Chico, disse que os Militares o atrapalharam muito na sua carreira artística, mas, ele atrapalhou os militares, tanto quanto. E dentre todas as artes em ascendência, na década de 60, a música foi o pivô principal, dessa revolução contra a ditadura. Eu estou tentando te dizer, que a ditadura, de certa forma, potencializou a arte. Desafiou os artistas daquela época, entende?
E para conhecer melhor, os ideais de Chico, é importante também conhecer a origem da família “Buarque de Holanda.” Então, vamos voltar um pouco esta fita.
“Sérgio Buarque de Holanda,” é pai de Chico. Ele nasceu em 1902, na cidade de São Paulo e em 1921, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se formou em direito, pela Universidade Federal. Em 1929, começou a trabalhar como jornalista, no “Jornal do Brasil” e seguiu para Berlim, ser correspondente, mas com o agravamento da guerra, voltou para o Brasil e tornou-se professor universitário. Casou-se com “Maria Amélia Alvim” e juntos, tiveram 6 filhos, além do Chico; claro.
Em 1939, Sérgio, fez carreira como historiador, assinando uma série de publicações, sobre a colonização portuguesa. Em 1946, voltou para São Paulo e assumiu a direção, do Museu Paulista, saudoso Museu do Ipiranga, do qual, eu fui vizinho por mais de 10 anos. Em 1953, a família Buarque de Holanda, se mudou para a Europa, pois, Sérgio, foi convidado para lecionar na Itália. É aí que a história de Chico com a música, começa a ser contada.
A casa do seu pai na Itália, era frequentada por intelectuais e artistas, entre eles, “Vinicius de Moraes,” o qual, levava um violão aos encontros e fascinava o pequeno Chico, ao tocá-lo.
Quieto, observador e tímido, Francisco Buarque de Holanda, nasceu em 1944. O dom pela arte, provavelmente é herança de sua mãe, pintora e pianista. Na adolescência, Chico, comprou um disco de João Gilberto. Ele, ouvia o dia todo; suas irmãs, diziam que chegava a ser irritante.
Regressou ao Brasil, em 1960 e com apenas 16 anos, já escrevia suas primeiras crônicas, para o jornal do colégio. Ele queria ser famoso, mas, a primeira manchete que uma foto sua foi publicada, saiu na coluna policial, do Jornal “Última Hora,” com os dizeres: “Pivetes Furtam um Carro e são Presos.”
Chico e um amigo, pegaram o carro de um vizinho, para dar voltas pelo bairro, durante a madrugada. A polícia os interceptou; levaram os pivetes para a delegacia e logo, foram liberados com a presença dos pais. Foi nessa época, que Chico, compôs suas primeiras marchinhas de carnaval. Ele, tocava o violão e suas irmãs, Miucha, Ana e Cristina, cantavam.
O Sonho do jovem Chico, era cantar como João Gilberto, fazer músicas como Tom Jobim e escrever como Vinicius de Morais. Ouça, “Canção dos Olhos.” Sua primeira composição.
Chico Buarque, chegou a ingressar no curso de arquitetura, da Universidade de São Paulo; ele, se dizia fascinado, pela obra de “Oscar Niemayer.” Logo que descobriu, que a arquitetura de Niemayer, não poderia ser aprendida em uma faculdade, a abandonou, para se dedicar exclusivamente à música. Sua primeira apresentação, foi no colégio Santa Cruz, cantando “Tem Mais Samba,” que ele fez sob encomenda, para o musical, “Balanço de Orfeu.” 1964, cara! Esse ano, vai ser muito repetido nesse episódio. Foi o ano do Golpe Militar. O clima nas ruas, ficou sombrio; a população estava dividida, mas na música, tudo ia bem. Os Festivais da Música Popular Brasileira, estavam em alta e em 1965, Chico, conheceu “Elis Regina”, que havia ganhado a última edição, com a canção, “Arrastão,” de Vinicius de Moraes e edu lobo. Tímido, Chico Buarque, se inscreveu no ano seguinte e se apresentou ao lado de Nara Leão. A canção, “Disparada,” interpretada por “Jair Rodrigues,” empatou em primeiro lugar, com, vejam só… “A Banda,” de Chico Buarque, que também ficou em primeiro lugar.
Com a carreira alavancada pelo festival, Chico, gravou seu primeiro disco, em 1966, onde além do sucesso, “A Banda,” outra canção, caiu nas graças do público: “Pedro Pedreiro.” Na letra, uma forte crítica, já chamava a atenção, do departamento de censura artística. E com o dinheiro que ganhou com essa canção, comprou seu primeiro carro… um Fusca.
Em 1967, aconteceu, o que hoje, é considerado por muitos críticos, como o maior de todos os festivais da MPB… “O Festival de 1967.” Chico, havia conseguido chegar na final e estava concorrendo, com a canção, “Roda Viva.” Na sua memorável apresentação de 67, ele, foi acompanhado pelo grupo “MPB4.” Lembrem…
Mas, a concorrência era duríssima. Naquele mesmo ano, estavam na final, Roberto Carlos, o brasa, ídolo da Jovem Guarda; Gilberto Gil, que vejam só, convidou os Mutantes para o acompanhar; entre outros, exímios intérpretes. Foi neste festival também, que Caetano Veloso, imortalizou a sua canção, “Alegria Alegria,”.. que se tornou um marco dos festivais.
Cara, aqueles festivais eram uma loucura. Lideravam a audiência na TV, mas, na plateia, torcidas organizadas se dividiam, aplaudiam e vaiavam muito. Uma das apresentações mais memoráveis desse festival, foi a do compositor e intérprete, “Sérgio Ricardo,” pois, foi tão vaiado, que acabou desistindo de cantar, mas, antes de abandonar o palco, quebrou o seu violão e o tacou na plateia. Essa cena, entrou para a história da música brasileira.
Chico Buarque, pegou o terceiro lugar; Gilberto Gil, ficou em segundo e a canção vencedora do festival de 67, foi “Ponteio,” de “Edu Lobo,” interpretada por ele, ao lado de “Marilia Medalha.”
A Rede Globo, não queria ficar pra trás e também, promoveu seu modelo de festival televisivo, o “Festival Internacional da Canção,” que teve 7 edições. Mas, sua principal edição, foi em 1968. Chico, havia se mudado para o Rio de Janeiro, onde conheceu e se casou, com a atriz “Marieta Severo.”
Chico, virou amigo do seu ídolo, “Tom Jobim” e juntos, participaram do filme, “Garota de Ipanema,” além disso, compuseram em parceria, a canção, “Sabiá,” que faturou o primeiro lugar, daquele Festival Internacional da Canção, da Globo de 1968.
Mas o diretor, “Walter Clark,” revelou em 1991, que a canção vencedora, não foi essa. Um comando do exército, invadiu a emissora e decretou, que, “Caminhando,” a canção preferida da audiência e dos jurados, não poderia receber o título, pois, em sua letra, trazia críticas ao governo militar. Sob muitas vaias, Tom e Chico, foram anunciados vencedores, mas, a verdadeira canção, vencedora desse festival, caiu nas graças do povo, e mesmo em segundo lugar, virou um hino da resistência, “Pra Não Dizer que Não Falei de Flores,” de “Geraldo Vandré.”
Chico, começava a compor trilhas; a primeira, foi para a peça teatral, “Morte e Vida Severina.” Depois disso, ele, escreveu sua primeira peça teatral, baseada na letra de sua música, Roda Viva. Mas, o Comando de Caça aos Comunistas, mais conhecido como “CCC,” invadiu o ensaio da peça Roda Viva, no teatro Ruth Escobar. Eles quebraram o cenário e espancaram os atores. A peça, só voltaria a entrar em cartaz, muitos anos depois, pois também foi censurada.
Era 1968, a linha dura da Ditadura, mostrava suas garras. Então, Chico e seus colegas da MPB, organizaram um enorme protesto. Ele, ficou conhecido como, “a passeata dos 100 mil;” uma marcha pacífica e ordenada, contra a ditadura militar. Praticamente, toda a ala artística, estava presente e aquilo, provocou a ira dos militares.
Mas, antes que aquele tipo de passeata, se tornasse moda, os militares, ainda em 1968, criaram o “AI5,” que ficou conhecido, como a mais extrema medida contra a democracia.
Pra você poder entender melhor, “AI,” é a sigla de “Ato Institucional,” que por si só, já fala do que se trata. Ao todo, os militares, baixaram 16 Atos institucionais. Isso, é a mesma coisa que rasgar a constituição.
Aquele ato número 5, resultou em perdas de direitos básicos, como a suspensão de qualquer garantia constitucional. Ainda, nas entrelinhas, eles, deixavam claro, que poderiam cassar qualquer parlamentar, que discordasse deles, e tornavam legal, a prática da tortura. Vejam vocês, que bizarro. Muitos jornalistas e artistas, apanharam e alguns até morreram.
A primeira canção de Chico a ser censurada, foi “Tamandaré,” composta para um musical, no qual, Chico, de forma genial, fazia um trocadilho com o almirante que havia sido estampado na nota de 1 cruzeiro.
O departamento de censura artística, era facilmente tapeado. Chico, disse que escrevia um texto grande, aleatório e colocava a letra da música no meio, e eles, liberavam a canção.
Apenas alguns dias, após o AI5 ser baixado, Chico, foi levado preso e interrogado. Os militares, queriam saber suas intenções com a passeata dos 100 mil e o verdadeiro significado de suas letras, mas Chico, conseguia tapear os milicos com facilidade, dando versões alternativas para as letras, que obviamente, falavam sobre ditadura
Em 1969, muitas pessoas estavam sendo torturadas e outras tantas, já haviam desaparecido. Esse negócio de ditadura militar, realmente, foi um troço sangrento e sério, cara. Temendo por sua integridade, Chico, que não podia sair da cidade sem autorização, se auto exilou na Itália, onde amargou um longo período de escassez financeira.
Foi na Itália, que nasceu a primeira filha de Chico e Marieta Severo.
Em 1970, a seleção Brasileira, ganhou o tri no México. Isso foi péssimo para a democracia, pois campanhas publicitárias do governo, divulgavam, que o país havia melhorado e sob o apelo de músicas empolgantes, como “Pra Frente Brasil,” o regime militar se fortalecia.
Após mais de um ano na Itália, Chico, voltou ao Brasil, coagido por empresários da sua gravadora, a “Philips,” que diziam, que o país estava melhorando. Mas na verdade, queriam mesmo, era lucrar, pois, a canção de Chico, “Apesar de Você,” estava estourada e sabe-se lá porquê, não havia sido censurada, mesmo com sua letra, sendo explicitamente, contra a ditadura.
Quando Chico, chegou ao aeroporto, uma multidão o esperava. Vários jornalistas, queriam uma exclusiva e até uma turnê, já estava agendada. O compacto, de “Apesar de Você,” já havia vendido 100 mil cópias e estava se tornando, mais um hino da resistência contra a ditadura.
Quando os militares, perceberam o erro que foi liberar essa canção, imediatamente, fecharam a gravadora, censuraram a música, recolheram todas as cópias do compacto e prenderam Chico, novamente. “Apesar de Você, só veio a ser liberada novamente, em 1978.
A inteligência militar, desconfiava que o “Você,” dessa canção, era o então presidente, o General Medici. Chico negou, claro. Ele dizia, que apenas falava de um relacionamento compulsivo, com uma garota qualquer, que era muito autoritária. Os militares engoliram mais essa e soltaram Chico, mas dessa vez, o cerco se fechou definitivamente.
No final dos anos 70, nasceu a segunda filha de Chico e e em 71, Chico lançou, o que muitos críticos, consideram o seu melhor álbum, “Construção,” onde suas canções, haviam sido escritas, durante o seu exílio na Itália.
Construção, vendeu 140 mil cópias, em apenas 4 semanas. A Philips, precisou alugar fábricas de seus concorrentes, para supri a demanda do disco.
A revista Rolling Stone, elegeu Construção, como o terceiro melhor disco, da música brasileira. Mas, muitas canções desse disco, também foram censuradas. Entre autos e baixos, Chico, resolve não participar da sexta edição do Festival Internacional da Canção, rompendo assim, seu contrato com a rede Globo, que por sua vez, estava apoiando a ditadura militar.
Pra piorar, existiam rumores, de uma rivalidade entre Chico e o movimento Tropicalista… Para acabar de vez com essa falácia, em 1972, Chico, gravou um disco ao vivo, chamado, “Caetano e Chico, Juntos e Ao Vivo.” Caetano, era um dos principais personagens da Tropicália e essa parceria, deu muito certo e rende frutos, até hoje.
Em 73, após compor e atuar no filme, “Quando o Carnaval Chegar,” Chico, se envolveu com o dramaturgo, “Ruy Guerra” e juntos, escreveram a peça, “Calabar,” cujo a história, foi censurada, antes mesmo da estreia.
A Philips, tentou lançar o disco com as músicas da peça, Mas, sem chances. Devido a desconfiança, a maioria das canções foram censuradas e esse disco, foi um fiasco de vendas.
No mesmo ano, Chico, em parceria com Gilberto Gil, compôs uma de suas melhores canções, “Cálice.” mas nem preciso falar, né? Ela, foi censurada até pela gravadora, que desligou o microfone de Chico e Gil, durante uma apresentação ao vivo, quando tentaram cantar essa música.
Esse agravante, fez Chico, abandonar a Philips algum tempo depois e Cálice, só foi lançada oficialmente, em 1978, dividindo os vocais com “Milton Nascimento.”
Chico, tinha uma obrigação contratual, de lançar um disco novo por ano. Ele, estava nitidamente abatido, pois, censuravam tudo que ele fazia. Então, em 1974, ele lançou um disco interpretando canções de outros compositores. E ironicamente, o chamou de “Sinal Fechado.”
Não tinha mais acordo, sua relação com o departamento de censura, havia perdido toda a lógica; sobrou apenas a “birra.”
Então, em 1975, Chico, teve uma ideia genial; criar um pseudônimo, para tapear os milicos. Um alter ego que, assinaria as canções em seu lugar. Chico, o batizou de “Julinho da Adelaide” e a sua primeira canção, a ser aceita pela censura, se chamava, “Acorda Amor.” Um samba clássico,, sobre um sujeito que acorda no meio da noite e pede para sua mulher chamar o ladrão, porquê, a polícia tinha chegado. Ouçam o Julinho da Adelaide. Ele era demais!
Era a prova concreta, de que a perseguição, era apenas contra Chico, pois, por mais óbvia que fosse essa letra, passou pela censura. Então, ele fez o que devia fazer mesmo e continuou lançando músicas, com o pseudônimo de Julinho da Adelaide. Miúcha, irmã de Chico, gravou “Milagre Brasileiro,”
Mas, a principal canção de Julinho, foi economizada para um momento especial, pois, era a canção, que daria o drible na censura; nossa estrela máxima, do episódio 12 do Clube da Música Autoral… “Jorge Maravilha.”
Essa versão ao vivo que estamos ouvindo, foi gravada durante o “banquete dos mendigos” e é a primeira vez, que Chico, cantou Jorge Maravilha em público. O concerto, aconteceu no Museu da Arte Moderna, do Rio de Janeiro, durante as comemorações dos 25 anos da Declaração dos Direitos Humanos.
O refrão, pegou como chiclete, principalmente entre os jovens, afinal, quem nunca teve um sogro ou sogra que não ia muito com a nossa cara, né? Ah… eu já tive.
A imprensa, ficou doida e queria saber quem era o compositor daquela música e Chico, dava meias respostas; dizia, que o compositor, morava na Rocinha e não gostava muito de aparecer em público; Sua mãe se chamava “Adelaide” e era uma ótima cozinheira… coisas desse tipo.
Aquilo tudo, foi virando uma grande piada interna. Então, o jornalista e amigo pessoal de Chico, “Mario Prata,” sugeriu que ele, fizesse uma entrevista exclusiva, como se fosse realmente o Julinho da Adelaide falando. Então, marcaram a entrevista em São Paulo, justamente durante uma reunião etílica, na casa de Sérgio Buarque, pai de Chico, onde Mario Prata, já era um assíduo frequentador. Após muitas doses e muitas risadas, Chico, diz que vai relaxar um pouco e sobe para o quarto. Após uma hora, ele volta e não é mais Chico, é Julinho da Adelaide e todos os presentes, aderem a brincadeira.
A matéria, saiu com o nome de: “O samba duplex e pragmático, de Julinho da Adelaide.”
Eu encontrei a transcrição dessa entrevista na internet; ela toda é hilária, mas eu, separei alguns trechos aqui pra vocês.
Mario, começa perguntando, porquê Julinho, não gosta de aparecer em público e Julinho explica, que em 1967, estava na plateia, assistindo o festival da Record, então, Sérgio Ricardo, quebrou o violão e jogou na plateia. Segundo Julinho da Adelaide, o violão, o atingiu na cabeça e como ele tinha queloide, a cicatriz havia ficado bem feia, por isso, ele não saía em público.
Mário, segura o riso e pergunta a Julinho, se era verdade, que ele fazia oito ou nove sambas por dia e Julinho, confirma e diz que sim, e que também fazia samba duplex.
Para entender essa piada, precisamos lembrar que nessa época, aconteceu uma séria epidemia de meningite, na cidade de São Paulo, mas o governo militar, proibiu a os jornais de falarem sobre isso. Era um tabu, comentar sobre a epidemia, que estava matando centenas de paulistanos.
Julinho então, explicou para Mário, que o Samba Duplex, era um tipo de samba, que você podia mudar a letra e citou como exemplo, o samba que fez no ônibus, a caminho para São Paulo, no qual, a letra dizia: “eu fui para São Paulo com a Judith e só saí de lá, com a meningite.”
No samba Duplex, eu posso fazer uma versão paralela e caso alguém, proíba essa versão, eu já tenho outra no gatilho… “fui para São Paulo com meningite e saí com a Judith. Na mesa ao lado, estava o pai de Chico, rindo muito com toda aquela piada e ao ouvi-los falar sobre Adelaide, ele se levanta, vai até a biblioteca e pega um livro; mostra a Mário, a foto de uma negra, muito linda e vistosa, e diz pra ele, sussurrando: “Adelaide.”
Essa foto, foi publicada junto com a entrevista de Julinho da Adelaide, no Jornal Última Hora, de 8 de setembro de 1974.
Quando a entrevista foi publicada, a suspeita de que Chico, era o Julinho da Adelaide, cresceu e um jornalista de direita, amigo dos Militares, publicou uma matéria denúncia, no Jornal do Brasil, revelando a verdadeira identidade do Julinho da Adelaide.
Foi assim que o pessoal do departamento de censura, descobriu que Chico, os tinha tapeado mais uma vez. Vocês conseguem imaginar a cara deles?
O maior problema, foi que com a revelação da identidade secreta de Julinho, começaram as teorias malucas e Chico, foi acusado de ter feito Jorge Maravilha, para o general, então presidente, Ernesto Geisel, já que diziam que sua filha, Lucy, era fã declarada de Chico Buarque.
Olha o rolo que deu. Lá vai o pessoal do DOPS de novo, buscar Chico Buarque, para dar depoimento.
Chico, dessa vez, falou a verdade para os militares. Disse que escreveu essa canção, influenciado por uma situação cômica, que aconteceu em uma de suas várias prisões. No relato, Chico diz, que enquanto ele estava sendo escoltado, um dos militares, sacou um caderninho e lhe pediu um autógrafo. Disse, que seria para sua filha, uma grande fã dele. Então Chico, fez a música… “você não gosta de mim, mas sua filha gosta.”
Essa história que Chico contou, é a história verdadeira dessa canção, tá? Mas não adiantou, até hoje, todos falam que Chico, fez Jorge Maravilha, para a filha do General Geisel. Em uma entrevista recente, Chico diz, que nem se preocupa mais em desmentir essa história, pois ela, já virou até um dito popular. E eu tenho que admitir, a história da filha do Geisel, é muito mais legal mesmo.
Chico, ou se preferir, Julinho da Adelaide, refere-se a Jorge Maravilha, como sendo uma pessoa cheia de razão. O tal Jorge, com certeza é o “Jorge Bem Jor,” né? Ele havia ganhado o Festival Internacional da Canção daquele ano, com a música “Fio Maravilha,” que contava uma história sensacional, sobre um jogador de futebol. Chico, que era amigo de Jorge Bem, tentava pela primeira vez, flertar com o samba rock, marca registrada de Jorge Bem e talvez, seja por isso que ele tenha feito essa referência, ao Jorge BenJor.
Apesar de ter sido censurada, claro, Jorge Maravilha, só foi gravada e entrou em um disco, na compilação, “Palco, Corpo e Alma,” de 1978. Ano esse, em que o presidente, general Geisel, revogou o AI5. Todas as canções censuradas, puderam ser lançadas novamente.
E é assim, como Jorge Maravilha, prenho de razão, que chego ao fim de mais um episódio, do Clube da Música Autoral.
A Canção Jorge Maravilha, como a maioria dos sucessos de Chico Buarque, também foi regravada por muitos artistas, e fazendo jus a minha veia de roqueiro, vou encerrar esse episódio inspirador, com essa versão da banda “Play Mobile.”
Se você gostou do episódio de hoje, e estiver à vontade, deixe um comentário nas redes sociais; pode ser criticando ou elogiando. De boa, tá? Nem esquenta. No final dessa temporada, os principais, serão lidos em um episódio extra. Me procure no Facebook, no Instagram, no Twitter e no YouTube. É só digitar: “Clube da Música Autoral” e só de me seguir, você já começa a fazer parte desse Clube.
No WhatsApp, também rola uma lista de transmissão e se você quiser receber minhas mensagens por lá, assim como o áudio dos novos episódios, é só clicar no link que está na descrição, ou acessar a postagem desse episódio no site: clubedamusicaautoral.com.br, que você também encontra.
Olha, o Clube tem uma missão, que é espalhar músicas boas e histórias pela rede. Se você quiser, pode me ajudar nessa missão, votando e escolhendo os próximos episódios do Clube. Pra votar, você precisa ser sócio e isso, te custa apenas 10 reais. Acesse: clubedamusicaautoral.com.br/assine e seja um sócio oficial do Clube e ajude, para que essa ideia não morra.
E aviso, que se você ficar com gostinho de quero mais, estou deixando uma playlist no Spotify, com todas as musica que foram usadas nesse episódio.
Meu nome, é Gilson de Lazari e foi um prazer, falar de Música com vocês.
Até a próxima!
Olá. Esse foi o primeiro podcast que ouvi do Clube da Música Autoral. Gostei bastante e irei acompanhar sempre. Bela trabalho!
VOCES ME FIZERAM VOLTAR 54 ANOS ATRAS, NOS MEUS ANOS DOURADOS, TEMPO QUE NÃO VOLTA MAIS, QUE SAUDADES. ADORO O CHICO CANTOR E COMPOSITOR, INFELIZMENTE NÃO O HOMEM POLITICO.